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Artigo de Sérgio Magalhães: “Anomalia chamada Contratação Integrada-RDC”

A notícia não é boa e pede uma reflexão nossa. Na quarta-feira, 21 de outubro, sofremos uma dura derrota. Aumentou o alcance da Contratação Integrada-RDC, regime pelo qual o governo pode contratar obras públicas sem projeto. Isto é, contrata com a empreiteira tanto o projeto quanto a obra.

O RDC/Contratação Integrada foi criado por Medida Provisória com a desculpa que facilitaria as obras da Copa do Mundo. Depois foi estendido para obras da Olimpíada. Sucessivamente, o governo foi ampliando: para obras do PAC (e MCMV), para o SUS, etc. Em fevereiro de 2014, propôs ampliar para todas as obras públicas, nos três níveis de governo. Mas o Senado brecou essa MP, depois de intenso debate com firme participação das entidades de arquitetura e de engenharia.

Então, foi criada uma Comissão no Senado para o estudo da revisão da lei 8.666/93, que regula a licitação de obras públicas. A Câmara também criou a sua própria Comissão. Em ambas, continuamos com intensa participação na defesa do Projeto Completo como condicionante para a licitação de obras.

Há poucas semanas, o governo voltou à carga com outra MP, agora estendendo o RDC/Contratação Integrada para obras relacionadas à segurança pública (presídios, delegacias, etc.). A matéria foi à votação na Câmara há duas semanas, de surpresa, tendo a MP sido ainda mais ampliada, para obras de mobilidade e de infraestrutura. No Senado, quarta-feira, tudo foi aprovado.

Estamos nessa situação.

Até aqui parecia que nas Comissões do Congresso havia uma boa tendência para a exigência do Projeto Completo como condicionante para a licitação de obras públicas e a exclusão da Contratação Integrada. Mas com esse episódio de agora, parece que o sinal mudou.

É estarrecedor que se insista no método de contratação que se demonstra no dia a dia um poderoso estimulador para aditivos, aumentos de preços, aumento de prazos e redução da qualidade das obras públicas. E que, ademais, seja um passaporte para a corrupção, como a Operação Lava-Jato está evidenciando, quando as principais empreiteiras do país estão com seus dirigentes na cadeia.

Nós temos consciência do papel que o Estado tem na demanda dos serviços dos arquitetos.

Na medida em que o governo transfere o projeto para a responsabilidade (e interesse) da empreiteira, o trabalho do arquiteto se deteriora, a arquitetura se desqualifica, a própria cultura perde. Esse modelo também repercute na demanda privada, onde o fatiamento do projeto se fortalece em detrimento da autoria e da qualidade.

Tratados como atribuição privada, no jogo comercial-empresarial, o projeto e o planejamento das obras públicas se esfumaçam.

Sem projeto e sem planejamento nossas cidades não melhorarão. Sem projeto e sem planejamento nossas cidades reiterarão a desigualdade e a escassez de serviços públicos. É o próprio desenvolvimento nacional que se esvai.

Não obstante a ducha fria que a arquitetura brasileira acaba de receber, é indispensável que o IAB e as demais entidades de arquitetura e engenharia mantenham a sua unidade e continuemos no esforço conjunto para a revogação dessa anomalia chamada RDC/Contratação Integrada.

A força das nossas entidades está no acompanhamento e na participação de todos.

* Sérgio Magalhães é presidente do IAB-Direção Nacional, arquiteto e doutor em Urbanismo (UFRJ/FAU-Prourb), professor do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da FAU-UFRJ. Foi secretário municipal de Habitação do Rio de Janeiro (1993-2000) e secretário de Estado de Projetos Especiais do Rio de Janeiro (2001-2002). Recebeu o Prêmio FAD-2012, em Barcelona, concedido à PCRJ pelo Programa Favela-Bairro; recebeu do SAL-2013, em Bogotá, o “Prêmio América de Arquitetura”. 

Saiba mais:

Brasil ético exige projeto completo

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